Mais uma vez cheguei a Gramado, desta vez para curtir o feriadão de Corpus Christi. Como sempre faço, fiquei lá no SESC da Av. das Hortênsias, onde já fiz muitos amigos e sempre me recebem bem, com aquela recepção gaúcha regada a chimarrão, cuia, bomba e calça de punho, chê! É verdade, o pessoal do hotel do Sesc da linda e simpática cidade da Serra Gaúcha é muito competente, amável e sabe como poucos receber o turista. Mas minha ida àquelas bandas do sul estava relacionada também à vontade que tinha de registrar com minha câmara, que acabara de comprar, as imagens do outono, materializadas nos reflexos de luz e cores das folhas dos plátamos e dos pinheiros ao longo das estradas principais, dos caminhos dos vales, das estradas vicinais, das pequenas vilas do interior e das Linhas, que são caminhos abertos desde os tempos da colonização alemã. A noite de lua cheia, logo no primeiro dia de minha chegada arredondava o céu de Gramado, num tom aveludado de fazer arrepiar todos os corações românticos. Mas quando estava preparado para a primeira incursão noturna, o meu amigo Natalino, responsável pelos melhores coquetéis de toda a rede hoteleira da região, me disse que estava com um baita problema para resolver e, naquela hora, não via outra solução a não ser me pedir o favor de ir com ele rebocar o seu "cheiroso”, enguiçado numa rua de Canela, à mercê dos amigos do alheio. Não podia deixar de atender o pedido dele e saímos em direção ao velho e batalhador Santana dos idos de muito antigamente. A rua escura, na penumbra do luar de um artro tão encantador e ansiosa para despertar todas as mais escondidas emoções dobradas nos corações dos casais que visitavam a cidade, logo, logo se apresentou como o cenário ideal para algumas fotos de efeito. Antes dos preparos para o reboque do valente Volkswagen, saí escolhendo os melhores contrates entre sombras em meia-luz, entre a maciez do azul escuro da noite na branda e perfumada claridade, infiltrada nos galhos das araucárias e rapidamente preparei a máquina com os filtros próprios. Regulei o diafragma, acertei o foco, interpretei a distância exata entre o fundo, a forma e o grande vulto leitoso, arredondado, que surgia entre as árvores da floresta que se dividia pela passagem de uma ruela e pronto. Cliquei o obturador na certeza de estar imprimindo uma obra-prima, com direito a todos os prêmios fotográficos a serem divulgados no ano em curso... Estava tudo perfeito e fotograficamente correto. Quando cheguei a casa no domingo, ao revelar um dos filmes, muito tempo depois, é claro, de ter deixado o veículo de estimação de meu amigo em total segurança numa garagem, depois de muita coisa ter acontecido; de ter recebido os agradecimentos do Natalino por aquele "galho quebrado" num fim de noite; de ter tomado um "cabernet sauvignon" com ele e o Osório num barzinho no centro de Canela, percebi que havia na película acetinada a imagem de um casal que se amava escancaradamente na escuridão daquela enfeitiçada noite de lua cheia, indiferente aos flashes e ao barulho que fizemos amarrando as correntes para rebocar o carro enguiçado. Realmente, na ansiedade da captação da imagem não havia percebido os amantes enluarados. Pensei em me consagrar como o az das penumbras serranas, obtendo uma das mais significativas fotos de uma noite de outono na serra gaúcha e nem percebi que havia me consagrado como fotógrafo lambe-lambe... E como registrei lambidas... Aprendi naquela noite - e o que aprendi mesmo, foi que o amor está acima dos preconceitos e das vis pretensões humanas de se pensar certas atitudes como impróprias ao convívio social. Isso aconteceu em Gramado, verdadeiramente uma cidade incrível!
ATÉ A PRÓXIMA
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