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15 de maio de 2009

A MEDICINA NO RIO DE JANEIRO

Isto é um desabafo que vale a pena reproduzir aqui. Não costumo fazer desse meu espaço que é lido, basicamente, por meus amigos e por meus pares e equivalentes, pessoas, todas elas, tenho certeza, de alto nível intelectual e de excelente caráter. Sei que não disponho de um numeroso público, mas tenho certeza de que são honrados e com muitas qualidade, por isso merecedores dessas informações, principalmente quando o assunto atinge a dignidade de profissionais liberais como médicos e professores, agentes importantíssimos de qualquer estrutura social. A vocês, meus amigos, multiplicadores de minha indignação, dedico essa CARTA ABERTA de uma pediatra que trabalha para o Governo do Estado do Rio de Janeiro, que não quis se identificar, pois haveria retalhiamento.
A saúde é um assunto que muito me preocupa como educador, mesmo depois de aposentado, pois a educação só se efetiva em mentes e corpos sadiamente preparados para a mudança de comportamentos. Sempre fui professor. Trabalhei no Primário Supletivo, no Morro do Salgueiro, na Tijuca e em várias escolas estaduais de Nível Médio, desde Santa Cruz, Vila Kenned, Campo Grande, Vila da Penha, Vila Isabel e Tijuca. Aposentei-me como Professor Adjunto da UERJ e da UFF, em Niterói. Compreendi que a necessidade primordial para a aprendizagem está na saúde do corpo e da mente. Por isso, por ter plena consciência da infame condição de trabalho e remuneração dos médicos do Estado do Rio de Janeiro, publico o texto desta médica pediatra, na tentativa de ser mais uma voz a serviço da moralidade pública, na expectativa, também, de ver sanado um problema crônico de nossa vida social, devido, única e exclusivamente ao pífio comportamento de nossos políticos, quase todos corruptos, despreparados e mal intencionados.




Carta de uma médica pediátrica, que trabalha no Estado do Rio de Janeiro, ao governador Sr. Sérgio Cabral:




Sabe governador, somos contemporâneos, quase da mesma idade, mas vivemos em mundos bem diferentes. Sou classe média, bem média, médica, pediatra, deprimida e indignada com as canalhices que estão acontecendo. Não conheço bem a sua história pessoal e certamente o senhor não sabe nada da minha também. Fiz um vestibular bastante disputado e com grande empenho tive a oportunidade de freqüentar a Universidade do Estado do Rio de Janeiro, hoje esquartejada pela omissão e politiquices do poder público estadual.
Fiz treinamento no Hospital Pedro Ernesto, hoje vivendo de esmolas emergenciais em troca de leitos da dengue. Parece-me que o senhor desconhece esta realidade. O seu terceiro grau não foi tão suado assim, em universidade sem muito prestígio, curso na época pouco disputado, turma de meninos Zona Sul ... Aprendi medicina em hospital de pobre, trabalhei muito sem remuneração em troca de aprendizado. Ao final do curso nova seleção, agora para residência. Mais trabalho com pouco dinheiro e pacientes pobres, o povo. Sempre fui doutrinada a fazer o máximo com o mínimo. Muitas noites sem dormir, e lhe garanto que não foram em salinhas refrigeradas costurando coligações e acordos para o povo que o senhor nem conhece o cheiro ou choro em momento de dor. No início da década de noventa fui aprovada num concurso para ser médica da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro'. A melhor decisão da minha vida, da qual hoje mais do que nunca não me arrependo, foi abandonar este cargo. Não se pode querer ser Dom Quixote, herói ou justiceiro. Dói assistir a morte por falta de recursos. Dói como mãe de quatro filhos, ver outros filhos de outras mães não serem salvos por falta de condições de trabalho. Fingir que trabalha, fingir que é médico, estar cara-a-cara com o paciente como representante de um sistema de saúde ridículo, ter a possibilidade de se contaminar e se acostumar com uma pseudo-medicina é doloroso, aviltante e uma enorme frustração. Aprendi em muitas daquelas noites insones tudo o que sei fazer e gosto muito do que eu faço. Sou médica porque gosto. Sou pediatra por opção e com convicção. Não me arrependo. Prometi a mim mesma fazer o melhor de mim. É um deboche numa cidade como o Rio de Janeiro, num estado como o nosso assistir políticos como o senhor discursarem com a cara mais lavada que este é o momento de deixar de lengalenga para salvar vidas. Que vidas, senhor governador? Nas UPAS? tudo de fachada para engabelar o povão!!!! Por amor ao povo o senhor trabalharia pelo que o senhor paga ao médico? Os médicos não criaram os mosquitos. Os hospitais não estão com problema somente agora. Não faltam especialistas. O que falta é quem queira se sujeitar a triste realidade do médico da SES para tentar resolver emergencialmente a omissão de anos.
A mídia planta terrorismo no coração das mães que desesperadas correm a qualquer sintoma inespecífico para as urgências. Não há pediatra neste momento que não esteja sobrecarregado. Mesmo na medicina privada há uma grande dificuldade em administrar uma demanda absurda de atendimentos em clínicas, consultórios ou telefones. Todos em pânico. E aí vem o senhor com a história do lengalenga. Acorde governador! Hoje o senhor é poder executivo. Esqueça um pouco das fotos com o presidente e com a mãe do PAC, esqueça a escolha do prefeito, esqueça a carinha de bom moço consternado na televisão.
Faça a mudança. Execute. "Lengalenga" é não mudar os hospitais e os salários. Quem sabe o senhor poderia trabalhar como voluntário também. Chame a sua família. Venha sentir o stress de uma mãe, não daquelas de pracinha com babá, que o senhor bem conhece, mas daquelas que nem podem faltar ao trabalho para cuidar de um filho doente. Venha preparado porque as pessoas estão armadas, com pouca tolerância, em pânico. Quem sabe entra no seu nariz o cheiro do pobre, do povo e o senhor tenta virar o jogo. A responsabilidade é sua, governador. Afinal, quem é, ou são, os vagabundos, Governador?

NOTA: Em atenção ao pedido da Dra. Isabel Lepsch, que pode ser lido nos comentários abaixo, retiro o seu nome da autoria da Carta, que, efetivamente, foi escrita por outra pessoa. Leiam as explicações e entenderão. Obrigado!



ATÉ A PRÓXIMA

2 comentários:

Andrea Pio de Abreu disse...

"Dói assistir a morte por falta de recursos"...

Realmente esta é a maior dor que um médico pode ter. Uma dor que não ameniza diante de toda esta caótica realidade.

Abraço,
Andrea

Isabel Lepsch disse...

OLÁ! sou Maria Isabel Lepsch: gostaria de esclarecer que esta carta foi enviada aos meus clientes e seu título foi alterado: no meu email dizia:"CARTA DE UMA COLEGA PEDIATRA AO GOVERNADOR": como no final do email vinha meu end. e tel. pois minha filha na época havia acabado de adicionar no fim da página para sair automaticamente e eu não me dei conta, ao repassar , alguem alterou e colocou meu nome como título...peço a gentileza de alterar:retirando meu nome e dizendo q foi uma médica pediatra q não quis se identificar pois trabalha por govern.,num hospital do RIO,ok? GRATA! Dra.M.Isabel Lepsch

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Balneário Camboriú, Sul/Santa Catarina, Brazil
Sou professor adjunto aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sou formado em Letras Clássicas pela UERJ. Pertenço à Academia Brasileira de Filologia (ABRAFIL), Cadeira Nº 28.