Quantos me visitaram ?

10 de maio de 2018

PEDRO BALA



Vou contar um "causo" futebolístico, quase uma crônica. Assisti a um jogo, onde Pedro Bala jogava pela ponta direita do tricolor suburbano, o Madureira, o velho Madura. O palco estava montado em Conselheiro Galvão, num domingo de sol escaldante e pouco vento. Todos os torcedores homens sem camisas. Embora o campo fosse do Madureira, a maior torcida era do Flamengo. Eu era adolescente e fora ao jogo com os vizinhos, gente muito respeitada em quem meu pai confiava piamente. Todos nós éramos tricolores, mas meu vizinho levou também sua neta que namorava um flamenguista, morador algumas casas depois da nossa, mais perto da Praça Seca, em Jacarepaguá. Era o Nelson Proporção, apelido de colégio, pois tinha as pernas mais curtas, em proporção ao corpo. Entenderam, né? A observação popular costuma batizar fatos, coisas e objetos com e por estranhamentos, e isso dá à situação um quê especial de graça e, muitas vezes, de poesia. Lembram-se do nome da cachorra do casal de retirantes de Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Pois é, ninguém na família tinha nome próprio, só a cachorra que vivia naquele deserto sem água, era a Baleia. Mas voltando ao derby suburbano. Estava sentado na arquibancada ensolarada, junto ao alambrado do campo, com todos os distintos vizinhos. Naquela época nos campos de futebol, quando apareciam senhoras nas arquibancadas, até os bêbados se comportavam como coroinhas de missas solenes das grandes catedrais. Pois é. Lá estavam meu vizinho, sua esposa, filha, genro e a neta com seu namorado, quase noivo. Pedro Bala estava infernizando a vida da defesa do Flamengo e era o próprio demônio chutando para o gol e cruzando perigosamente a bola para a grande área rubro-negra. Ao passar driblando e em disparada, somente comparada com a de julinho, muito tempo depois, aquele mesmo Julinho do Palmeiras e da Seleção Brasileira, a distinta torcida flamenguista e suburbana da mulambada assanhada, esquecendo o código de honra até então em vigor, uníssona, entoou o coro de Pedro Baaala...; Baaala Filho-da-Puta...; Pedro Filho-da-Puta...; Pedro Baaala Filho da Puta! Ficaram meus vizinhos, noivas, avó, avô e toda a parentada com cara de santos barrocos descascados, envergonhadíssimos e quase congelados, apesar do tremendo calor que fazia...Pensam que ficou nisso? Meus amigos, Pedro Bala cortou o lateral esquerde, creio que era o Jordan, foi em direção à meia-lua da área, e deu uma pedrada com a perna esquerda que o som da bola de atacar foi ouvido nas duas plataformas da estação de trem, muito longe do gramado. A bola entrou no arco e bateu violentamente no garfo que sustenta a rede voltando para a entrada da área. Pedro Bala pulou no pescoço de um companheiro de equipe e outro o beijou escandalosamente. Mas a bola, que veio de dentro da meta flamenguista, caiu no peito do destemido Pavão, valente e raçudo beque central do mengão, que deu um bico pra frente e não mais me lembro quem chutou para o gol e fez Flamengo um a zero, pois o juiz não anotou o gol de Pedro Bala e validou o do Flamengo. O tempo fechou em Conselheiro Galvão. Eu e meus vizinhos só chegamos em casa às 10 hora da noite, pois Madureira toda se transformou num campo de batalha e nós tivemos que esperar que a Cruz Vermelha nos atendesse, pois éramos, quase todos, tricolores e não tínhamos nada a ver com aquilo.

ATÉ A PRÓXIMA

Nenhum comentário:

Powered By Blogger

Arquivo do blog

Quem sou eu

Minha foto
Balneário Camboriú, Sul/Santa Catarina, Brazil
Sou professor adjunto aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sou formado em Letras Clássicas pela UERJ. Pertenço à Academia Brasileira de Filologia (ABRAFIL), Cadeira Nº 28.